Decisão favorável às empresas significará extinção de fonte de recursos para Estados em meio à crise agravada pela pandemia, além do risco de ações judiciais movidas por mineradoras para tentar recuperar ao menos parte dos valores pagos.
Fonte: Terra Notícias | Por: Mariana Durão
Data: 06/04/2021 (leia na íntegra)
RIO O Supremo Tribunal Federal (STF) pode encerrar no dia 14 de abril uma batalha fiscal de uma década entre mineradoras e os governos de Minas Gerais, Pará e Amapá. A corte vai julgar a constitucionalidade das taxas de fiscalização da exploração de recursos minerais, questionada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em nome do setor. Uma decisão favorável às empresas significará a extinção de uma fonte de recursos para os Estados em meio à crise agravada pela pandemia, além do risco de ações judiciais movidas por mineradoras para tentar recuperar ao menos parte dos valores pagos.
A indústria alega que as leis estaduais criaram um “imposto mascarado de taxa”, em busca de receita. Em recentes julgamentos envolvendo taxas similares, o STF decidiu que os Estados têm competência para criá-las, mas julgou inconstitucional o valor cobrado quando ele não é proporcional ao custo da fiscalização da extração dos recursos naturais. De acordo com especialistas, os recursos de taxas só podem ser usados para a finalidade determinada em sua criação, e cobrar a taxa de acordo com a produção das mineradoras seria desproporcional.
O efeito dominó de criação de Taxas de Controle, Monitoramento e Fiscalização das Atividades de Pesquisa, Lavra, Exploração e Aproveitamento de Recursos Minerários (TFRM) pelos Estados a partir de 2011, seguindo a criada em Minas Gerais, é atribuído por juristas à demora do governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em apresentar um projeto de lei aumentando o valor da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), o royalty da mineração. Criada para pressionar pelo aumento, a TFRM acabou mantida mesmo após a mudança na alíquota da CFEM, em 2017.
A falta de equivalência entre o valor cobrado do contribuinte e o gasto no exercício da fiscalização pelos Estados será o principal argumento da CNI nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 4785 (Minas Gerais), 4786 (Pará) e 4787 (Amapá). A primeira e a última, pautadas para o dia 14, devem estabelecer um precedente para o caso do Pará.
A sócia da área tributária do Azevedo Sette Advogados, Clarissa Viana, explica que a arrecadação de impostos como o IPVA é totalmente desvinculada e pode ser aplicada onde os Estados quiserem. Já o dinheiro levantado com uma taxa deve ser usado para custear a atividade a que ela se destina – no caso específico, fiscalizar a mineração. Caso o STF considere a taxa mineral inconstitucional, nada impede que os Estados, através do Legislativo, criem novas taxas, desde que respeitem a regra da proporcionalidade. “A discussão principal é: por que o Estado cobra a taxa com base na produção mineral, se o custo para fiscalizar não está ligado a isso?”, diz.
Precedente favorável
Alguns julgamentos recentes da Suprema Corte em matérias similares criam precedentes favoráveis à tese das mineradoras. Em abril de 2020, foi reconhecida a inconstitucionalidade da Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização Ambiental (TFPG), do Rio de Janeiro. A base de cálculo (barril de petróleo extraído) foi considerada incongruente com os custos da fiscalização. Em junho, o Plenário do STF suspendeu a Taxa de Fiscalização de Recursos Hídricos (TFRH) do Pará, repetindo o ocorrido em dezembro de 2019 na ADI nº 6.211/AP, em que declarou ilegítima a Taxa de Exploração de Recursos Hídricos do Amapá, com base no mesmo argumento.
A CNI deve apresentar cálculos reforçando a ausência de equivalência entre o valor cobrado das mineradoras e o custo da atividade de fiscalização pelos governos. O superintendente jurídico da entidade, Cassio Borges, aponta que um desfecho positivo abre caminho para pleitos individuais.
“Em regra, os efeitos da decisão de inconstitucionalidade retroagem. Excepcionalmente a Corte modula isso. Em princípio, a CNI espera que haja efeito retroativo, a permitir que eventualmente seja devolvido o valor cobrado em excesso”, diz.
Apesar dos precedentes favoráveis, a situação está indefinida. O STF chegou a iniciar o julgamento virtual do caso em outubro passado e, até a interrupção, por um pedido de destaque do ministro Luiz Fux, havia seis votos a favor da constitucionalidade da taxa. Eles incluíam o do relator, ministro Edson Fachin, que considerou a base de cálculo adotada pela lei mineira (a quantidade de minério extraído) razoável. Votaram pela invalidade do tributo os ministros Marco Aurélio, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes.
O pedido de destaque deve levar o caso à estaca zero, mas o governo mineiro peticionou para que os votos sejam mantidos e o julgamento retomado de onde parou.
Apesar de estar pautada para o dia 14, a ação corre o risco de ter seu desfecho postergado por dois fatores. O primeira é o de que o novato ministro Kassio Nunes Marques pode pedir vista para se inteirar melhor do assunto – ele é relator da ADI do Pará. Além disso, está marcado para o mesmo dia o julgamento dos recursos contra a decisão do ministro Fachin que anulou as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Lava Jato no Paraná.