Alíquota baixa de royalty é desafio para cidades produtoras de diamantes

19/02/2017 – O Globo (leia na integra)

Efeitos. Beneficiamento de diamante na Bahia: cidades ganham empregos, mas sofrem pressão por serviços públicos Foto: Divulgação

RIO – Raro na natureza, o diamante pode ser negociado a centenas de dólares por quilate, impulsionando as exportações dos países produtores. Pouco dessa riqueza, porém, fica nos municípios. A alíquota da Compensação Financeira pela Exploração dos Recursos Minerais (Cfem), o royalty da mineração, é de apenas 0,2% para as pedras preciosas, a mais baixa de todos os minerais. Um desafio para as cidades produtoras, que têm de lidar com a enxurrada de pessoas em busca de trabalho ou do próprio diamante, e a pressão por serviços públicos.

Um caso exemplar de como o dinheiro movimentado pela atividade não é garantia de vida melhor para os moradores é o de Juína, no Mato Grosso. Lá, o garimpo teve seu auge entre 1988 e 1993. Os diamantes eram vendidos nas praças. A produção era tal que a cidade ficou conhecida por abrigar a Bolsa de Diamantes do Brasil, numa época em que o mercado ilegal corria solto.

SEVIÇOS PÚBLICOS SOB PRESÃO

Passados mais de 20 anos do boom da atividade em Juína, a cidade ainda exibe baixos indicadores socioeconômicos. Segundo dados do IBGE, o PIB per capita de Juína era de R$ 19.667 em 2014 (último dado disponível), bem abaixo da média nacional, de R$ 28.498,21. E apenas 7,88% das residências tinham fossa ou estavam ligadas ao sistema de coleta de esgoto em 2010, pelos dados do Censo. O índice nacional era de 67% na época.

— A infraestrutura não acompanhou a expansão da cidade. A contribuição para a arrecadação municipal é irrisória. O ganho para as cidades está na geração de emprego, que é temporária, e na movimentação do comércio local — diz o prefeito de Juína, Altir Peruzzo (PT).

A alíquota da Cfem incide sobre a receita líquida com a venda dos diamantes, descontando-se despesas com outros tributos, transporte e seguro. O município fica com 65% do total. O restante é distribuído entre União e estado produtor. Apesar de ter uma fatia maior, o impacto na receita municipal é muito pequeno.

Segundo Peruzzo, a exploração de diamantes chegou a empregar cerca de 3 mil trabalhadores nos tempos áureos. Hoje, são 300 a 400 pessoas, para uma população estimada em 39.734 habitantes em 2016, no cálculo do IBGE.

O descompasso no ritmo da elevação da arrecadação e o aumento da demanda pelos serviços públicos é uma característica da atividade mineradora, lembra Bruno Milanez, um dos coordenadores do Núcleo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade (Poemas) da Universidade Federal de Juiz de Fora:

— Tem aquele primeiro momento da expansão dos projetos, que cria demandas sociais. Mas o impacto sobre a receita das cidades vem apenas no futuro.

MENOS DANOS NA EXPLORAÇÃO

No aspecto ambiental, a exploração de diamantes provoca menos danos que a de outros minerais, como ouro, em que são usados químicos na produção.

— O impacto é físico, especialmente na produção de diamante primário, pois abre-se uma cratera no solo — diz Jurger Schnellrath, do Laboratório de Pesquisas Gemológicas do Centro de Tecnologia Mineral (Cetem).

A revisão do Código Mineral, proposta no governo Dilma Rousseff, previa o aumento das alíquotas da Cfem, o que daria mais fôlego financeiro às prefeituras. A discussão, porém, está parada. Segundo Bruno Feigelson, do Lima Feigelson Advogados, a tendência é que a proposta original seja fatiada e que a Cfem seja tratada em decreto ou projeto de lei em separado.

Procurado, o Ministério de Minas e Energia informou estar “em estudo e em fase de efetivação” uma série de ações para revitalizar a atividade mineral, incluindo as regras do Código Mineral, “que poderão ser separadas em temas relacionados”.